domingo, setembro 12, 2010

Um dia muito mau

A manhã de segunda-feira, dia 6 de Setembro, foi passada no Bairro da Bela Vista, em Setúbal, a vacinar ovelhas. Regressei às instalações do ADS por volta do meio-dia. A administrativa e a engenheira estavam lá. Poisei as coisas, dei os bons dias à administrativa. Fui buscar uma garrafa de água ao outro escritório, onde estava a engenheira. Aproveitei para falar com ela, dar-lhe os bons dias… conversa de circunstância. Contou-me as peripécias do fim-de-semana, perguntou se a manhã me tinha corrido bem. Disse-lhe onde tinha estado, e rimo-nos por lhe ter dito que tinha voltado são e salvo.

Voltei ao meu gabinete. Abri o mail. Reparei que a DGV me tinha enviado um mapa com formações. Algumas delas poderiam interessar à engenheira. Voltei ao gabinete dela.

Conversámos cerca de 20-30 minutos. Falei-lhe das formações, ela pediu-me o mapa para ver quais as que lhe interessavam. Programou-se, por alto, em irmos a uma dessas formações em Outubro. Falámos da Festa das Vindimas, das corridas de toiros, brincou comigo acerca das férias que eu não iria gozar este ano.

Por volta do meio-dia e meia saí do gabinete dela, fui a casa almoçar. Quando voltei do almoço, fui informado que se tinha suicidado.

Não acreditei. Não podia acreditar. Ainda por cima lá, nos escritórios! Corri em choque e incrédulo até ao local. Deparei-me com um corpo inanimado, e toda uma cena de contornos macabros. É uma imagem que, infelizmente, não consigo esquecer.

O meu auxiliar de campo, que me tinha dado a notícia, estava igualmente em choque. Éramos os únicos lá. Fomos os únicos a testemunhar aquilo. A GNR tomou conta do ocorrido, e as instalações do ADS ficaram sob controlo policial. A PJ chegou hora e meia depois. Um a um, foram surgindo os membros da direcção do ADS. Um familiar apareceu mais tarde, para ficar com os pertences.

"Não faz sentido. Isto não faz sentido nenhum". Ninguém percebeu as razões que a levaram fazer aquilo, até porque era uma mulher nova, bem casada e com duas filhas. Estava no melhor momento da sua carreira profissional. Era a pessoa mais calma e, ao que tudo indicava, a mais equilibrada de todas as que ali trabalhavam na Associação. Tinha estabilizado na vida, comprou uma casa de férias e tinha trocado de carro há pouco tempo.

Horas depois, a PJ informou-nos que deixou cartas a despedir-se, escritas entre as 10h30 e as 13h10. Fui o último a vê-la com vida, o último a falar com ela. Tive, por isso, que prestar declarações e ir até ao gabinete dela para verificar se havia alguma anormalidade desde a altura em que saí de lá.

É um passo bem pequeno aquele que nos leva ao desespero, à depressão. Às vezes até sem darmos por isso. Não se pensa com clareza, pelo menos com a clarividência que todos nós que estamos de fora pensamos que temos. Há toda uma espiral de sentimentos que se vão acumulando, e para nos livrarmos deles toma-se, por vezes, a pior decisão. Mas por norma há sinais.

Tenho-me em boa conta no que diz respeito a interpretar reacções, a ler as pessoas. E custa-me não ter percebido nada naqueles 20-30 minutos de conversa que tive com ela antes de sair para o almoço. Questiono-me como pode alguém que sabe que se vai matar dali a meia hora, brincar comigo, fazer planos, rir-se, comentar eventos. Não se mostrou incomodada com a minha presença no gabinete dela. Aliás, puxou um ou dois assuntos à baila. E eu não apanhei nada.

São 5h19 AM. Não consigo dormir. Estou cansado, acordado há 24 horas praticamente... Levanto-me, deito-me, não sou capaz de permanecer quieto na cama. Quando fecho os olhos, não dá.

1 comentário:

Inês Pais disse...

Não posso acreditar!!!! Deves estar de rastos!!!! Um bjo do tamanho do mundo. Ligo-te amanhã.