domingo, junho 28, 2015

No one cares

Para um tipo que, como eu, vive e trabalha fora de Portugal, o Facebook acaba por se tornar a ferramenta de eleição para acompanhar o que se passa com os amigos e com a família. Pasmem-se os que achavam que a resposta era "pombos correio".
Mas com o bom vem o mau, e por cada visita que faço para me inteirar das novidades, gradualmente concluo que muitos posts deveriam manter-se privados. Contudo, escrever um diário é tão 1990!, e a privacidade está sobrevalorizada. É notório que para muita gente não haver feedback a cada parágrafo redigido sabe a pouco. É também certo e sabido que para esta maltinha, a única reacção aceitável tem que ser positiva (ufa!, ainda bem que não há dislikes no Facebook!). Partilhar é humano, e opiniões todos temos uma. E sim!, é super importante que todos vejam e saibam da batalha pessoal do ceguinho ex-toxicodependente que toca piano com os pés e que levou toda a gente às lágrimas na última edição do Ídolos no Vietname. 





Saber o que a Célia e o Osvaldo andam a fazer é na boa. Saber o que a Célia e o Osvaldo andam constantemente a fazer, é stalking e deveria dar a origem a uma providência cautelar. Contra eles, claro. Quando se pensa que tem muito para partilhar, eventualmente damo-nos a conhecer mais do que deveríamos. E estatisticamente, é bem provável que nem todas as partilhas tenham relevância. Atrevo-me a dizer (e olha pra mim, todo atrevidote), que algumas possam ser supérfluas e desnecessárias. E contra mim falo, eu que sou um grande fã do ridículo alheio. Já agora, um grande bem-haja para toda a parvoíce cibernética, e para a que mais me intriga: o narcisismo tecnológico.




A tecnologia veio para ficar, e eu ainda sou do tempo em que tínhamos de ser selectivos com as fotografias que tirávamos, pois cada rolo tinha 24-36 possibilidades, e metade das fotos tinham o meu dedo à frente. A outra metade ficava queimada pelo Sol. Os gelados que eu não comia só para pagar a revelação! Esse tempo já passou, e hoje em dia o croissant do pequeno-almoço tem direito a 20 fotos antes de se escolher o melhor filtro para, consequentemente, publicarmos nas redes sociais e causarmos inveja alheia. É esse o objectivo, certo? 

Fotos de refeições 
Pés na praia  
Uma nova peça de roupa 
Fim de tarde com um copo de cerveja 
Concerto da banda favorita  Hmmmm, tão booooom.
Paisagens paradisíacas  
Em suma, mais e mais recordações de momentos que só eu (ou um grupo restrito) vivi. Mais é sempre melhor. Hey, já repararam que estou bronzeada? Vejam como eu e os meus amigos somos super cool e nos estamos a marimbar para o resto da sociedade. Agora vejam isso mais 15 vezes. 




Porque parar é morrer, e mudar regularmente a foto de perfil é a (única) maneira de repararem em nós, de sermos comentados e relembrados. Como se houvesse uma necessidade contínua em nos anunciarmos ao mundo. Quando na verdade, estamos a desenhar os traços da nossa própria solidão.

A nossa vida, pelos olhos das outras pessoas. Ser feliz não é a mesma coisa que mostrar aos outros que estou feliz. Papar a tipa da novela da TVI é irrelevante se ninguém souber, certo?

A questão, lá está, não é a foto/opinião: é a publicação da mesma. É a partilha constante de tudo o que acontece com toda a gente. Seria melhor se a partilha permanecesse constante mas só com amigos próximos/família? Ou se mesmo não sendo selectiva nas pessoas, fosse restrita a momentos importantes? 
Não. 

Para a Renata é importante que toda a gente saiba que a felicidade não é um destino, é uma viagem. Para o Ivo, isso é irrelevante tendo em atenção que o Verão está aí e ele tem cerca de mais 18 abdominais desde a última vez que os mostrou ao Mundo (ontem). Ela "taga-o" no próximo post. Ele comenta. Ela responde. Ele faz like. Ela smiley-face o like. Ele menciona os abdominais novamente. Ela sugere que a beleza está nos olhos de quem a vê. O Ivo tira uma selfie à barriga e diz-lhe que os olhos também comem. Nós assistimos desconfortavelmente a um bate-boca que, mais do que privado, deveria ser categorizado como irritante para a vista. 

Felizmente o Facebook, ciente do avançar dos tempos, criou igualmente ferramentas contra o partilhar excessivo. Com um simples click, podemos escolher ver menos posts de determinada pessoa, deixando o gigante tecnológico determinar o que é ou não relevante. E se os tempos avançarem correctamente, não faltará muito até haver botões de dislike / don't care, ou até o Facebook fazer um reparo a lembrar os compartilhantes que já é a 4ª foto que publicam em poucos dias do mesmo gato enfadado, ou que têm um ratio de 0.83 likes por post colocado de um pôr-do-Sol na praia com o título "tão booom", ou até mesmo um aviso à circulação do provável uso exagerado de Photoshop nas fotos (que por sinal, diferem significativamente das últimas publicadas):


De qualquer maneira, e até esse dia não chegar, haverá sempre os que julgam terem feito a escolha acertada ao manterem a vida pessoal mais privada. Mesmo que sejam menos interessantes aos olhos do Mundo. Para esses tenho uma palavra: #boring.



























































































































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