terça-feira, novembro 27, 2007

Olhos nos olhos


"Eu não sou um mau condutor."
Esta é uma opinião que, na generalidade, todos os portugueses têm acerca de si próprios. Mesmo que no momento em que a tenham, estejam a conduzir em contramão, a falar ao telemóvel e a tirar burriés.

Há uns tempos, o John Cleese tentou explicar (num programa que fez com a Elizabeth Hurley) porque razão as pessoas se irritavam tanto no trânsito. Dizia ele que era por falta de contacto visual. A única forma de nos expressarmos no trânsito, é através da buzina. Se na rua, ele fosse de encontro contra outra pessoa (e se tal não ocorresse de propósito), bastava um olhar para que se percebesse que tal não tinha passado de um acidente. Dentro dos veículos, os condutores não têm acesso à expressão facial dos restantes condutores, e por isso não percebem de imediato as suas intenções. Dito isto, passemos à prática.

Parado na fila da zona das Portagens, na Ponte 25 de Abril, reparo que o Fiat Punto à minha frente está a aproximar-se cada vez mais do meu carro. Como eu não estou a andar, isso só pode significar que é o condutor do outro veículo que está a deixar «descair» o carro. Como já me bateram duas vezes no carro desta maneira, resolvo agir.

Faço sinais de luzes... nada.
Mais sinais de luzes... e o carro já está a menos de meio metro.
Finalmente, buzino. E qual é a reacção?

A condutora do Fiat Punto trava o carro, olha para o retrovisor, abre a janela e grita


"PASSA POR CIMA!!"


Aparentemente, ela pensou que eu lhe tinha buzinado porque queria que ela andasse com o carro (no meio da aproximação do veículo dela ao meu, nem reparei que a fila já devia estar a andar). Como explicar-lhe o mal-entendido? E valeria a pena?

Até ao momento em que pagou na portagem, a rapariga insistiu em demonstrar a sua discordância através de gestos reveladores, a que eu assistia impávido (e sereno... até deu para rir). Quando a ultrapassei no tabuleiro da Ponte, olhou para mim como quem diz "Deves estar cheio de pressa, ó acelera!!"

O mesmo se tinha passado há uns tempos com outra condutora, na Av. António Augusto Aguiar, em Lisboa. Para me ultrapassar, tinha saído da faixa central para a da direita, e quando reparou que a faixa dela não andava, quis mudar-se de novo para a minha, e eu buzinei-lhe. Assim pensou ela. Na verdade, o taxista à minha esquerda, embora fosse obrigado a seguir nessa direcção, quis passar um risco contínuo e meter-se na minha faixa, sem sinalização. Buzinei-lhe, e quem reagiu mal foi a senhora, que buzinou de volta, gesticulando e gritando veementemente, pensando que era para ela. Se a carapuça lhe serve..

A verdade é que há uma tendência natural para o confronto. Provavelmente as situações seriam sanadas com diálogo, mas ninguém se vai por a sair dos carros e dialogar com os restantes condutores (a não ser que seja para constatar factos acerca das mães uns dos outros).

Por isso sugiro que todos os carros venham de série com megafones embutidos. Ou então buzinas com diferentes dizeres, tipo "Eu é que me apresentava pela direita, ó distinto condutor do veículo a quem buzino", ou então "Apesar de poder constatar que a mala do seu carro tem, de facto, um acabamento formidável, gostaria de lhe lembrar que o sinal verde já caíu há mais de 20 segundos".

E o Mundo seria um lugar bem melhor.

7 comentários:

Vetoon disse...

Que interessante os dois condutores pertencerem ao sexo feminino...

Mike disse...

Fiquei surpreendido com o facto de que quando carregaste na buzina o teu carro não se ter desmanchado todo.
PS:Podias ter passado por cima dela!Era um convite!

Mike disse...

Fiquei surpreendido com o facto de que quando carregaste na buzina o teu carro não se ter desmanchado todo.
PS:Podias ter passado por cima dela!Era um convite!

sara disse...

lol!
Ainda há pouco tempo levei uma repreensão gestual de um carro à minha frente. E porquê? Porque o carro atrás de mim decidiu apitar. A sinalética "passa por cima ó caramela" acabou dirigida a mim, tadinha, q estava pacientemente à espera. Injustiças da vida, enfim.

gAnDaMaLuKo disse...

Sim, é uma grande coincidência ambas as condutoras pertencerem ao sexo feminino...
Quanto ao meu carro não se ter desmanchado com a buzinadela, é bom sinal: se também não se foi abaixo quando te levei lá dentro (e ao teu laptop, e à tua pochette, e aos 3 kg de chaves que levas contigo diariamente), então é porque está a ficar rijo com a idade!
Quanto às buzinadelas feitas à menina s., são perfeitamente entendíveis: tirei a carta consigo, e sei que VExª conduz como se não houvesse amanhã! Como membro do sexo feminino, será sempre bode expiatório em qualquer altercação no trânsito. E com razão.

sara disse...

ui, que engraçadinho... fica sabendo que a idade tem-me apaziguado as fúrias automobilísticas. comparada com essa altura, estou praticamente budista. olé! ;)

gAnDaMaLuKo disse...

Ainda outro dia passei pelo teu automóvel ("como é que sabes qual é o meu automóvel??!?", perguntas tu), e pelo estado em que se apresentava, duvido que te tenhas tornado zen ao volante...