segunda-feira, junho 26, 2006

Dormindo com o inimigo

Portugal vs Nederland



Pintaram casas de laranja. Havia bandeiras hasteadas em todas as portas. Na rua, ouviam-se cânticos, e já se falava do próximo jogo contra a Inglaterra. A televisão inundava os espectadores com imagens da “laranja mecânica”, da carreira do Van Basten, e da prolífica campanha de 1988. A festa estava feita.

A televisão holandesa não tem por hábito falar de Portugal, ou noticiar o que por aí ocorre. Tirando as vezes em que se falou do Benfica na Liga das Campeões, pouco mais ouvi falar da terra-mãe. Até ontem.

O dia começou, e no noticiário pude constatar que falavam de Portugal. A notícia? Manifestação Gay em Lisboa. Abriam as hostilidades. Passam-se meses sem uma palavra acerca do meu país, e põem-se agora a dizer que os portugueses são larilas.

Felizmente não fui o único a ter registado a notícia. Horas depois, em Montreal, o Tiago Monteiro abalroou o companheiro de equipa, Christijan Albers (holandês), logo na primeira volta. É para saber "o que a casa gasta".

À hora do jogo, a televisão holandesa resolveu omitir o hino nacional português. Deve ter sido coincidência. Felizmente tenho-o gravado no meu telemóvel, e posso pô-lo a tocar sempre que queira. É o que tenho feito, desde 21 de Junho, em todo e qualquer lugar onde se encontrem holandeses.

O Van Basten resolve colocar o Kuyt em jogo, como ponta-de-lança, o que por si só era bom sinal para a nossa Selecção. O rapaz até joga bem, e marca uns golitos pelo Feijonoord, mas não joga naquela posição. No entanto, Boulahrouz tinha sido o melhor em campo contra a Argentina, e preocupava-me que estivesse na equipa titular. E começou bem o jogo, com uma bonita patada que "arrumou" o C.Ronaldo.



Patada



Depois veio o golo. Cachecol nas mãos, olhos postos no visor, muitas palavras pouco abonatórias das mães dos jogadores holandeses. Mas essencialmente, alegria. Porém, o espectáculo só agora começava.

O Costinha resolveu acabar a primeira parte em grande. Após duas entradas perigosas, resolveu aplicar em campo toda a sua experiência, e num lance a meio-campo, pôs a pata na poça (melhor dizendo, na bola). Por vezes ajuda ter um Q.I. com mais de um dígito para se jogar futebol.

Na segunda parte, continua a guerra campal. O Ricardo fica lesionado no chão enquanto Deco, na posse da bola, segue num contra-ataque perigoso. O senhor Ivanov resolve interromper o jogo para assistir o guarda-redes lusitano. No reatamento, os jogadores holandeses esquecem-se daquela coisa chamada “Fair-Play”, e não devolvem a bola aos portugueses*. É certo e sabido que alguém ia apanhar na tromba, e teve que ser o Deco a devolver o "Fair-Play”, “portuguese style”. Armou-se a confusão, e o Petit teve a sorte de ter sido empurrado enquanto se preparava para dar uns sopapos no jogador holandês que se quedava no relvado.

O coração ficou nas mãos quando o Cocu atira a bola à barra. Entretanto, o Figo leva na cara, e os comentadores holandeses apressam-se a dizer que foi muito teatral, e que não aconteceu nada (as palavras «helemaal niks» ficaram-me na memória). 10 contra 10.



A porradaria continua, o Deco apanha o 2° amarelo por fazer algo a que já nos habituou, o Figo dá uma cornada no Van Bommel, o Ricardo apanha com os pitons nos tintins (suponho que tenha ficado com a voz ainda mais aguda, se tal for possível), os holandeses batem-se ao penalty, e o chorrilho de cartões continua.

Entra Tiago, sai Figo, mais um vermelho e já são 9 contra 9. Está quase um jogo de andebol (que é um jogo que o Costinha conhece melhor). 6 minutos após os 90, e acaba a tormenta. Os holandeses na televisão relevam o mau trabalho do árbitro, e as lágrimas dos jogadores da Oranje. Os portugas fazem a festa em campo.

O Van Basten aparecia agora na televisão, queixando-se da má exibição do árbitro, da excessiva dramatização dos jogadores portugueses (nas palavras dele, “o jogo foi uma telenovela”), dos penalties não marcados (?!?), da não utilização do Van Nistelrooij porque as expulsões assim não o deixaram, etc etc. Depois foi para a conferência de imprensa, em inglês, com outro discurso, acabando por dizer que a equipa que tinha escolhido para este Mundial estava aqui para ganhar experiência, e que o objectivo dele era na verdade o Europeu de 2008... (talvez apanhem Portugal nas eliminatórias outra vez)

Misschien volgende keer!

Quis sair de casa e por-me a gritar. Pensei melhor, visto que já passava das onze da noite, chovia abundantemente (e trovejava), e amanhã estava a pé às 5. Os laranjinhas (não confundir com o pessoal da JSD) regressavam agora a suas casas, molhados e revoltados, e não sei porquê, a imagem de um português aos saltos a gritar "POR-TU-GAL, POR-TU-GAL" não me parecia a mais adequada à situação. E convinha manter os dentes todos para poder gozar com eles no dia seguinte. E seguiu-se o frenesim dos telemóveis.

Enquanto atendia os telemóveis, e atendia aos diversos SMS, assistia na televisão ao comentário da partida, feito pelo Dani (??!!?), esse fantástico jogador português que resolveu deixar o futebol e seguir a carreira de comentador-futebolístico-dos-jogos-em-que-Portugal-participa-contra-a-Holanda. Convidado pelo canal holandês "Talpa", Dani esgrimia argumentos (em inglês) contra os 6 holandeses que o rodeavam na mesa. Tive pena que não tivesse apanhado naquela carinha laroca, não por ser um gajo arrogante que mete asco a quem o conhece (suponho eu...), mas porque podia assim tornar-se no mártir lusitano em terras neerlandesas, livrando os imigrantes de futuras represálias. Enfim, nem tudo foi perfeito ontem à noite.

A adrenalina era muita, e eu não conseguia dormir. Às duas da manhã, ainda assistia aos comentários dos jornalistas da BBC1, eufóricos por Portugal ter ficado sem muitos jogadores-chave (Deco, Costinha – para eles é um jogador importante, e muito provavelmente Ronaldo) para o embate contra a Inglaterra. A ver vamos.

Eu por aqui faço a festa. Trouxe o meu cachecol na mala, e já o usei hoje na rua. Sempre que posso, já aqui o afirmei, ponho o toque do Hino Nacional a tocar no meu telemóvel. Não é que eu seja provocador, mas porra!, sou um português na Holanda, e seria absurdo (direi mesmo, ilógico) desperdiçar uma oportunidade destas. Enquanto houver voz, memória e vontade, farei destes gajos a chacota do meu estágio.

* NOTA DE AUTOR - Há uns anos atrás, um outro holandês (Marc Overmars) protagonizou uma cena semelhante, enquanto jogava pelo Arsenal, chegando mesmo a marcar golo enquanto os adversários ainda aguardavam pelo devolver da bola. O episódio foi famoso, e até valeu um prémio "Fair Play" ao treinador do Arsenal (Arsène Wenger), visto que este repudiou o acto do seu próprio jogador, e pediu para que o jogo fosse repetido.

5 comentários:

Mike disse...

Charlie! Ontem andei feito parvo no meio da maralha a percorrer a Av. da República! Ainda estive para ir ao Marquês, mas ao que parece um tipo malhou da estátua. Levou um pouco a sério de mais esta coisa da invencibilidade lusitana...
Porquê tanta algazarra por ir a uns 1/4 de final? Porque posso não ter a oportunidade de repetir a gracinha...

Vetoon disse...

Vai-te a eles! Eu se fosse a ti entrava pelo teu lugar de trabalho e começava a cantar: Herois do mar...

Anónimo disse...

Emoção do Portugal-Holanda vitima português de Amarante
Um adepto português morreu ontem à noite em Amarante depois de terminado o jogo Portugal-Holanda, alegadamente vítima de ataque cardíaco, informou hoje uma dos bombeiros locais.
A vítima, de 61 anos de idade, que residia em Moure, Lufrei, Amarante, foi transportada ao hospital de Santo António, no Porto, onde acabou por falecer.
De acordo com a fonte, os bombeiros foram chamados à residência do adepto cerca das 22:20, alguns minutos depois de concluído o jogo de futebol que atingiu alta emoção e em que Portugal venceu a Holanda por 1-0.
Aparentemente o indivíduo não resistiu às emoções da partida e terá sido vítima de um ataque cardíaco, embora a causa da morte apenas seja conhecida após a realização da autópsia

Tu a festejares e os teus conterrâneos a lerparem...

Vasco Monte disse...

Fdx...Num sitio onde o que não falta é "gaijas" boas, altas e espadaudas, loiras e malucas como à merda e tu andas a fazer comentarios acerca da bola...Fdx...Vai tás gajas car...o, trás uma nora prós teus Pais....


Fica bem meu "Gandamaluko" do teu novo primo...

P.s.- Vai-te às gajas cara....o!!!!!

Anónimo disse...

U moet me verklaren dit later!! ;)

jocas jocas